Por Grazi
– Desculpa moça! Aqui não tem nada bonito para fotografar pra você.
Uma frase dita depois de três minutos com a câmera na mão. Um sorriso envergonhado. Que vontade de chorar!
A menina de oito anos apareceu em nossa primeira visita ao Jardim Maravilha, a maior favela da Cidade Tiradentes. O nome dela é Graziele como o meu, mas as semelhanças acabaram aí. Aos oito anos, aquela Grazi frequenta a escola quando a polícia a deixa passar. Utiliza a mesa improvisada do lado de fora do barraco para fazer alguns rabiscos no caderno com o único lápis que tem.
“Eu também quero fazer faculdade, assim como você”, disse a menina enquanto usava minha câmera fotográfica para registrar o lugar onde vive. Podridão e calor. Esse seria o aroma da fotografia de Grazi.
A menina decidiu procurar algo para fotografar do lado de fora do pequeno barraco. Pia, sofá e uma TV com a imagem borrada. Ao centro do único cômodo construído sobre o chão de terra batida está a cama de casal, que a garota divide com os pais desempregados e um irmão frequentemente embriagado.
Olhando a cena por trás, vi quando a pequena desistiu de encontrar um bom ângulo para fotografar os canos, que despejam esgoto no córrego que passa atrás de sua casa. Água suja, ratos, cachorro brincando com esgoto. O dedinho de Grazi estava aflito sobre o clique da máquina. Ela procurou, procurou e depois dos três minutos mais longos da minha vida voltou o rosto com ar de decepção e me pediu desculpas.
Ah! Gole grosso esse que desceu pela minha garganta. A saída do momento foi embarcar na busca de uma paisagem bonita para fotografar. Duas garotas com o mesmo nome e, naquele momento, com o mesmo objetivo. Varrer com o olhar cada centímetro do quintal da menina em busca de uma boa foto. Uma foto que representasse o meu pedido de desculpas por não fazer nada para que o cenário da vida dela ficasse mais bonito.
Um papagaio de madeira. Uma árvore. Um céu. Cenas que são bonitas no asfalto ou na favela. Tiramos a fotografia. Ganhei um abraço, uma foto e a falsa impressão que conforta os impotentes.
O gole grosso volta a descer agora quando aperto o botão de stop ao final de nosso vídeo de 32 minutos. Grazi não faz parte de nosso documentário. Sua história está contada apenas em nossas mentes. Como gostaria de ter uma câmera nos olhos.
Doze visitas se seguiram à primeira que fizemos ao Jardim Maravilha. Em nenhuma delas Grazi voltou. “Ela está brincando”. “Está na casa de uma amiga”. Entre uma olhada e outra para nosso equipamento de gravação, essas eram as respostas de seu pai, cada dia mais embriagado e menos paciente. Em um dia ouvimos de uma garota que Grazi havia fugido de casa. Que tinha ido para a rua. Impotência. Nó. Revolta. Grazi foi procurar na rua uma cena melhor para fotografar. Grazi, espero que você faça faculdade!